segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

SEXUALIDADE HUMANA - II



1-    MOMENTO DE LIBERAÇÃO E DE PERPLEXIDADE
Se usarmos os recursos todos da ciência, da cibernética, da tecnologia, da filosofia e da antropologia seria possível adentrar com segurança na questão da sexualidade?
Para defini-la e sobretudo chegar a uma indicação segura sobre a melhor maneira de vivê-la, deve-se partir de uma imagem clara da pessoa humana sexuada, homem ou mulher.
Porém, talvez seja ingenuidade definir o que é ser pessoa humana sexuada numa sociedade em que a ordem é a mutação, nada sendo considerado certo, definitivo ou absoluto e “a tolerância se revela como o valor prioritário de toda a sociedade”3. No atual contexto cultural ocidental, surge até a indiferença diante da dificuldade em encontrar uma fundamentação segura.
Uma vez estabelecido que a verdade objetiva não está garantida, a melhor solução é que cada um aja conforme sua vontade. Ou, mais, a própria liberdade de agir conforme parecer conveniente a cada pessoa é apresentada como o valor único de referência.
Naturalmente, surge a inclinação em direção ao menos exigente e ao que incomoda menos, sobretudo em uma sociedade globalizada, em que o consumo e o conforto é a válvula de escape, sinal de poder e de sucesso e, ao mesmo tempo, está impregnada pelo conceito de que a regulação do instinto pela moral ou pela ética leva a uma patologia, à perda da liberdade. Aqui entram em concordância os que temem a “moral burguesa e reacionária que oprime a mulher”4.
Para alguns, a sexualidade humana é comum aos animais, apenas complicada com o desenvolvimento afetivo e racional da espécie. A ética civil tende, então, a se reduzir ao mínimo indispensável trazendo para o horizonte do comportamento sexual, a tolerância quase total, desde que exista o consentimento das partes envolvidas.
O bem e o mal vêm se configurando por força da lei e pode se tornar cada vez mais confuso distinguir entre o legal e o ético trazendo o perigo do conformismo diante do que parece ser a opinião da maioria. São apresentados fundamentos nos modelos da Ética subjetivista ou liberal-radical, ancorando-se nas bases do modelo pragmático-utilitarista ao procurar o acordo para uma convivência social5.
No centro da revolução sexual, o puritanismo que tanto escravizou em épocas anteriores tende a ser substituído pela submissão diante dos impulsos da sexualidade como diante de um destino imposto. 
Nesse contexto, o próprio projeto educativo torna-se o da libertação total de regras e a ética se reduziria à responsabilidade exclusiva de evitar as conseqüências desagradáveis, sobretudo uma gravidez não planejada e as doenças sexualmente transmissíveis6.
Entretanto, os questionamentos sobre a sexualidade persistem em meio à constatação de sua força explosiva e de sua ambigüidade.
O que de início aparece como uma pulsão simples apresenta raízes e ligações imprevistas. Na aparência, motiva um atuar livre, mas está também sujeita a forças ocultas dificilmente identificáveis. Utiliza uma linguagem de ternura, porém inesperadamente pode desencadear agressividades profundas.
É lugar de gozo e de festa, mas pode cair na tristeza, no desânimo, no desencanto. Sobretudo, dificilmente a pessoa se diz saciada ao dar livre vazão aos seus impulsos como aconteceria com outro impulso biológico.
No campo da sexualidade, constata-se como a pessoa humana é muito mais complexa do que se detecta exteriormente. É preciso reconhecer a existência de algo que permite descobrir uma realidade simbólica, um sentido que se expressa através de cada fato existencial levando a ultrapassar o naturalismo biológico, sobretudo naqueles atos que mais profundamente atingem a própria intimidade inatingível à análise científica: o núcleo da vida, o próprio eu.
 Aqui se inclui a percepção da busca da felicidade e a constatação de que, para além do caráter lúdico e do caráter impulsivo do sexo, encontra-se a sinalização de uma intencionalidade mais profunda, bem como o potencial de procurar seu objetivo e sua realização.
Ao buscarmos uma antropologia que melhor defina a pessoa humana, nos propomos a encontrar o caminho mais seguro de resposta aos seus anseios que transcendem os condicionamentos circunstanciais e que sinalize como integrar os fatos existenciais em um propósito de vida.
Isto, sem dúvida, é um dos objetivos da Bioética. A ponte que visa não só a sobrevivência da humanidade, mas que pode indicar rumos para uma realização individual plena e propriamente humana como também apresenta bases para a exigência irrenunciável de organizar o comportamento humano em sociedade.

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